Depois de uma avalanche de IPO’s anunciados no início do ano – alguns bens sucedidos, outros adiados ou cancelados em virtude das condições de demanda – chega ao ouvido do investidor brasileiro uma nova sigla para compor a sopa de letrinhas do mercado financeiro: as SPACs.
UM CHEQUE EM BRANCO
Uma SPAC – Special Purpose Acquisiton Company – é uma companhia criada com propósito específico de adquirir outras companhias.
Pode se comparar as SPACs à Fundos de Investimentos em Participações (FIPs) onde investidores delegam aos gestores a função de alocar fortunas na aquisição de participação em empresas de capital fechado.
Os FIPs, no entanto, costumam ter objetivos bem definidos em relação ao tempo e setor de investimento, e são geridos de perto sob os atentos olhos dos seus cotistas.
As SPACs, por outro lado, buscam suas fontes de financiamento através de um IPO – uma abertura de capital no mercado de ações – e possui ampla liberdade para realizar seu investimento. Sim: “Investimento”, no singular!
O objetivo da SPAC é encontrar um único alvo para ser adquirido, agindo como uma forma de abrir o capital desta companhia de forma indireta e o mais rápido possível.
Como o IPO é realizado muitas vezes sem ter o target definido ainda, mas as ações já podem ser negociadas na bolsa de valores, as SPACs são conhecidas como Companhias de Cheque em Branco (“Blank-check company” em inglês).
O BOOM DAS SPACS
Apesar de existirem desde os anos 1990, foi na última década que elas se tornaram mais populares. Segundo o site www.spacresearch.com , o volume movimentado por estas companhias em suas aberturas de capital pulou de US$1,8 bilhões em 2014 para US$ 83,3 bilhões em 2020:
Na última semana a sigla apareceu em quase todos os jornais do Brasil, com a notícia de que a Embraer, a Empresa Brasileira de Aeronáutica, a terceira maior empresa do mundo no setor de aviação, anunciou uma possível fusão de seu braço de carros voadores com uma SPAC nos Estados Unidos.
A Eve foi fundada pela Embraer em 2020, com foco no desenvolvimento de veículos elétricos de decolagem e pouso vertical.
Já a Zanite Acquisition foi fundada e abriu seu capital também em 2020, levantando aproximadamente US$ 200 milhões.
RISCOS E BENEFÍCIOS
Apesar de deixar investidores animados, principalmente os brasileiros, que agora veem uma das principais empresas do país mais uma vez na vanguarda da inovação tecnológica e financeira, alguns especialistas já chamam atenção para o boom das SPACs durante a crise dos anos 2020-2021, salientando a ocorrência de diversos IPO’s baseados em pouco ou nenhum fundamento econômico e o cancelamento de diversos outros.
Nesse contexto, o risco da opção por este tipo de investimento é confiar única e exclusivamente na habilidade dos gestores da companhia em identificar boas oportunidades no mercado de fusões e aquisições para alocar o seu cheque em branco, sem poder contar com a capacidade de análise do investidor privado para escolher seus investimentos.
Por outro lado, os tomadores de risco podem ser recompensados com altos retornos ao se tornarem Early Adopters – os primeiros a adotar uma tendência – em uma futura empresa operacional com capital aberto.
Para uma companhia que opta por realizar a sua abertura de capital através da fusão com uma SPAC, a vantagem é a agilidade do processo, que elimina uma séria de procedimentos burocráticos exigidos pelas autarquias como a SEC (nos EUA) e a CVM (no Brasil) e, por consequência, custos com a contratação de assessores financeiros e jurídicos e a realização de road-shows usualmente demandados em uma operação de IPO.
Como exemplo da busca de uma SPAC como “rota de fuga” do processo de IPO, podemos citar a WeWork, conhecida empresa americana de escritórios compartilhados, que tentou se tornar pública em 2019, sendo frustrada em suas negociações com investidores.
Rumores correm no mercado que a empresa em breve se unirá à BowX, SPAC surgida em outubro de 2020 e que conta com Shaquille O’neil entre seus conselheiros mais famosos.
A OPERAÇÃO
Após aberto o capital da SPAC e escolhido o target, a aquisição costuma se dar de forma rápida, seguida da incorporação da adquirida em aumento de capital na SPAC, com a emissão de novas ações desta última.
Essa operação possui uma série de nuances e especificidades, que requerem a interpretação de diversas normas diferentes para o correto reconhecimento contábil da operação, mas este já é assunto para outro artigo.