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Artigo 256: Aprovação de Aquisição pela Assembleia-Geral da Compradora

Artigo 256 e a Lei das SA

O mercado de Fusões e Aquisições (“Mergers and Acquisitions” ou “M&A”) está bastante aquecido. Conforme apontam estudos, em 2021, só no Brasil, foram transacionados mais de R$ 285 bilhões em mais de 1.169 operações do tipo, superando os R$ 229 bilhões em 1.549 operações de 2020. Exemplos desses tipos de operações são a compra do Grupo Porto Dias pela rede de hospitais Mater Dei por R$ 1,2 bilhão e da compra da Echoenergia pela Equatorial Energia por cerca de R$ 6,6 bilhões.

Para que essas operações sejam concretizadas, as empresas precisam seguir diversas normas societárias, fiscais e contábeis. Neste artigo, vamos tratar especificamente de uma delas: o artigo 256 da Lei n° 6.404/76 (Lei das S.A.), que protege os acionistas minoritários permitindo que ele tenha o direito de retirada em determinadas situações.

Antes de abortar esse artigo, é necessário ressaltar alguns pontos. No Brasil, existem diversos tipos societários, dentre eles: Sociedade em Comandita Simples, Sociedade Empresarial Limitada, Sociedade Anônima, entre outros. Como a Lei nº6.404/76 trata apenas de Sociedades Anônimas, as demais sociedades não serão pontuadas ao longo do texto 

As Sociedades Anônimas são aquelas que possuem seu capital dividido em ações, podendo ser de capital aberto – empresas listadas na Bolsa de Valores, como a Vale (VALE3), Banco do Brasil (BBAS3) e Petrobrás (PETR3 e PETR4) – ou capital fechado.

Lei das Sociedades Anônimas

A Lei das Sociedades Anônimas, conhecida também como Lei das SA, é a Lei n° 6.404 decretada em 15 de dezembro de 1976, que instrui toda a legislação aplicável ao direito societário que regula uma empresa com este tipo societário.

Via de regra, sociedades anônimas possuem sócios minoritários, que não tem poder de voto suficiente para influenciar a tomada de decisão da companhia por si só.

Uma vez que a Lei das S.A. foi formulada com base em princípios de transparência e proteção aos acionistas minoritários, fica justificada a obrigação de se ter um avaliador independente para a elaboração de laudos de avaliação econômica ou contábil.

Desta forma, um avaliador independente garante que o minoritário não está sendo prejudicado em operações orquestradas por seus sócios controladores, permitindo a eles determinados direitos, como por exemplo o direito de retirada e o tag along.

Artigo 256

Esse artigo tem o intuito de auxiliar o acionista minoritário ao impor normas que uma empresa de capital aberto deve seguir ao comprar qualquer sociedade mercantil, permitindo a verificação de um possível abuso na definição do preço de compra, por exemplo. Essa cláusula dispõe que é necessário a deliberação da assembleia-geral da compradora sempre que:

“I – O preço de compra constituir, para a compradora, investimento relevante; ou

II – o preço médio de cada ação ou quota ultrapassar uma vez e meia o maior dos 3 (três) valores a seguir indicados:

        a) cotação média das ações em bolsa ou no mercado de balcão organizado, durante os noventa dias anteriores à data da contratação;

        b) valor de patrimônio líquido da ação ou quota, avaliado o patrimônio a preços de mercado;

        c) valor do lucro líquido da ação ou quota, que não poderá ser superior a 15 (quinze) vezes o lucro líquido anual por ação nos 2 (dois) últimos exercícios sociais, atualizado monetariamente.

§ 1º A proposta ou o contrato de compra, acompanhado de laudo de avaliação, observado o disposto no art. 8º, §§ 1º e 6º, será submetido à prévia autorização da assembleia-geral, ou à sua ratificação, sob pena de responsabilidade dos administradores, instruído com todos os elementos necessários à deliberação.

§ 2º Se o preço da aquisição ultrapassar uma vez e meia o maior dos três valores de que trata o inciso II do caput, o acionista dissidente da deliberação da assembleia que a aprovar terá o direito de retirar-se da companhia mediante reembolso do valor de suas ações, nos termos do art. 137, observado o disposto em seu inciso II.”

Desse modo, é possível classificar a análise em quatro partes:

  1. Investimento Relevante;
  2. Cotação Média das Ações em Bolsa;
  3. Patrimônio Líquido a Mercado;
  4. Lucro Líquido da Ação.

I – Investimento Relevante

O artigo 247 determina que o investimento relevante ocorre quando o valor contábil for igual ou superior a 10% (dez por cento) do valor do patrimônio líquido da empresa compradora ou quando o valor contábil for igual ou superior a 15% (quinze por cento) do valor do patrimônio líquido no conjunto das sociedades coligadas e controladas.

Os seguintes três critérios ponderam acerca do mesmo assunto: o preço médio por ação não deve ser superior a uma vez e meia ao valor a ser comparado.

II – Cotação Média das Ações em Bolsa

Esse fundamento determina que seja utilizado o preço médio por ação negociado na bolsa de valores da empresa dos últimos 90 dias. Entretanto, há casos em que isso não se aplica, visto que nem todas as empresas são de capital aberto.

III – Patrimônio Líquido a Mercado;

Esse preceito impõe que o Patrimônio Líquido da empresa seja trazido à preços de mercado. Em suma, é necessário avaliar os saldos contábeis registrados nos ativos e passivos, além dos ativos não contabilizados (como é o caso de alguns intangíveis), e ajustá-los a prováveis valores de realização.

A avaliação do Patrimônio Líquido a Mercado parte do pressuposto da simulação de uma liquidação ordenada da sociedade, conforme entendimentos contemplados nos itens XV a XVIII do Anexo III da Instrução CVM nº 361/2002.

IV – Lucro Líquido da Ação

Esse critério determina que o lucro líquido da ação não pode ser maior do que 15 vezes o lucro líquido anual por ação dos dois últimos exercícios sociais atualizado monetariamente. 

Por “lucro líquido da ação”, já é pacificado o entendimento de se ler “fluxo de caixa descontado” (FDC), que é a metodologia mais aplicada em avaliações pela abordagem da renda.

Uma situação curiosa para este critério é que, caso o lucro líquido anual médio dos dois últimos exercícios seja negativo, esse teste não é aplicável.

Portanto, os fundamentos determinantes do art. n° 256 da Lei das SA englobam os critérios estabelecidos para que a operação não prejudique os acionistas minoritários. Desse modo, com base em princípios de transparência e proteção aos mesmos, os parâmetros exigidos pela lei permitem que seja demonstrado que a compra de qualquer sociedade mercantil não teve preços abusivos. 

Entretanto, caso o preço de compra seja considerado investimento relevante ou o preço médio de cada ação ou quota ultrapassar uma vez e meia o maior dos critérios, é necessária convocação de Assembleia Geral e os sócios minoritários podem optar por exercer o direito de retirada ou não. 

A partir do supracitado ao longo do artigo, a seguir será realizado um exemplo expondo os pontos que foram abordados.

Exemplo:

A empresa ABC S.A. adquiriu 100% da empresa de capital fechado XPTO S.A. que possui 18.500 cotas. Sabe-se que a primeira possui um patrimônio líquido de 100 milhões de reais e contraprestação transferida foi de R$ 800 mil. Assim, tem-se as seguintes observações:

Em relação ao primeiro item, concluímos que a operação não representa um investimento relevante, uma vez que o valor contábil representa 0,80% do Patrimônio Líquido da ABC S.A.

No que tange o segundo item, como a empresa XPTO S.A. não possui ações negociadas na bolsa de valores, por ser de capital fechado, esta metodologia de avaliação não é aplicável ao 

caso em tela.

O intuito do terceiro item, é o de verificar o somatório dos valores de ativos e passivos de uma empresa, analisados individualmente e isoladamente, em um cenário de liquidação ordenada, sendo o ponto de partida para a avaliação os saldos contábeis registrados dos ativos e dos passivos das companhias. Tais saldos são ajustados para refletirem seus prováveis valores de realização. Para auxiliar no exemplo, vamos supor que os devidos cálculos foram realizados e encontramos os seguintes valores ajustado a mercado:

Com isso posto, a tabela abaixo apresenta o resultado apurado:

Desse modo, encontramos um valor de 0,48x o valor pago por ação em relação ao Patrimônio Líquido a Mercado, assim, sendo inferior a uma vez e meia e, consequentemente, passando nesse critério.

Por fim, será analisado o critério do Lucro Líquido Projetado, que não deve ser superior a 15 vezes o valor do lucro líquido da ação nos últimos dois períodos, atualizado monetariamente. 

Considerando que a operação foi realizada em 2021, primeiramente testamos o limite de 15 vezes o lucro líquido histórico com base no lucro líquido anual por ação dos exercícios findos em 31 de dezembro de 2019 e 31 de dezembro de 2020, corrigidos monetariamente pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

Após o cálculo do lucro líquido anual histórico, atualizado monetariamente, foi analisado se o valor calculado, que é o limite do valor de teste para o critério do Lucro Líquido da Ação estipulado no art. 256, se enquadra no critério de 1,5x do inciso II do artigo 256 da Lei 6.404/1976:

Conforme verificado na tabela anterior, o limitador do fluxo de caixa descontado por ação é de 1,81x a média do lucro líquido anual histórico, atualizado monetariamente, ou seja, superior a uma vez e meia o valor pago por ação. Entretanto, é necessário realizar o fluxo de caixa descontado por ação, visto que ele pode ser inferior a uma vez e meia o valor pago. 

A avaliação pelo método do Fluxo de Caixa Descontado realizada pela Meden Consultoria, com objetivo de atender ao artigo 256 da Lei das S.A. nesta operação, indicou um valor de R$ 897.400 para XPTO, portanto, correspondendo a 0,89x o valor pago por ABC S.A. nas ações de XPTO:

Logo, com base nas análises realizadas e procedimentos descritos anteriormente, concluímos que o preço pago por ABC S.A. pelas ações da XPTO não ultrapassa uma vez e meia o maior dos três critérios passíveis de análise – sendo este, o Lucro Líquido por Ação – segundo o § 2º do artigo 256 da Lei 6.404./1976. Assim, não é necessário a convocação de uma Assembleia Geral, devido a não constatação de, por exemplo, um possível abuso na definição do preço de compra, conforme apresentado na tabela abaixo:

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